FOFOCA:
PSICODINÂMICA SOCIAL
Ensaio de Hiran Pinel, 23/04/2018.
Aqui-agora se trata de refletir sobre o cotidiano da
fofoca, sua psicodinâmica social – a subjetividade do sujeito, uma
subjetivação, algo em movimento produzida pelo ser-no-mundo. Há, por assim
dizer, e por ora, três personagens: o falador (que conta algo, um caso com
objetivo ou não de fofocar), o escutador (que irá espalhar, distorcer ou não) e
o sujeito objeto da fofoca (que pode ser o falador mesmo, ou falador falou de
um outro-outro, que é o mais comum).
Fazer fofoca é algo humano, pertence a essa
humanidade - eu faço, nós fazemos, ele faz, voa fazeis, eles fazem etc. Fala-se
algo, alguém escuta e passa pra frente - para as pessoas mais desbaratadas.
O primeiro falante/
falador já falou (talvez) alterando os fatos, e se falou de "fatos
mesmos" (verdades), é porque estão na esfera daquilo denominado delicado,
e se é delicado, qual o motivo de fazê-lo?
E o escutador
altera o fato já alterado, especialmente se o tema mexe com ele (sexualidade,
por exemplo; competição entre atores, em ambiente artístico, é outro exemplo).
Sendo verdade ou mentira ou alteração de uma verdade (mantém parte de uma
possível verdade e acrescenta uma mentira) ou opinião, o falador teoricamente
não está necessariamente fofocando, pois diz ao outro, esperando que a coisa
não se alastre - ele divide com o "amigo" algo que pra ele é denso,
tenso e intenso, mas não se reconhece nisso.
O falador pode estar a falar de sua própria dor, ou
porque morre de inveja, a está com despeito - sei lá... Melhor seria ele
procurar um psicólogo, mas o fofoqueiro tem desejos estranhos, e ao mesmo
tempo, pode não tem grana pra pagar esse profissional psi e ou diz que não
acredita em psicoterapia, afinal ele seria desmascarado no seu jogo barato de
teatro kkk
Mas pode ser que se faça fofoca desejando o
alastramento. O escutador escuta o falador, que deseja escutar o que ele deseja
(seu bel prazer) e passa adiante. O falante original (falador) pode elogiar a
pessoa algo de sua desconfiança, e se falou algo infeliz de um outro (o sujeito objeto da fofoca), o
escutador passa adiante e quiçá ele mesmo não conte diretamente para o objeto
humano (o sujeito tema do falante; o motivo da fofoca). O falador pode falar só
coisas elogiosas, e lá no meio fala que "o objeto do preconceito está
muito nervoso, e que ainda assim é lindo, maravilhoso, ator maravilhoso,
esplendoroso, que é líder do fã clube etc.", só que o fofoqueiro dirá ao
objeto o seguinte: o falador disse que vc é muito nervoso (fato).
Mas
precisava dizer isso? Prosseguindo, aparece o "acho que ele disse porquê..."
aí vem uma série de impropérios, inferência que geram angústias e histerias...
Tem vez que alguém lhe conta algo pra vc guardar, afinal ele contou pra dividir
sua tensão com o tema. Não deveria.
Outra coisa é o falador falar algo, e pronto, só
isso era seu desejo, falamos toda hora de si, do outro pertinho e distante (um
ídolo, por ex.), de um objeto, um governo etc., mas alguém escuta (escutador) e
distorce e faz fofoca - na origem não havia fofoca, mas um outro escuta num
determinado ponto e aumenta um pouco, as carências afetivas envolvidas são
imensas (o falador, o/s falante/s, o objeto original etc.), são
psicopatológicas, e pronto, é um motivo pra todos serem temas de atenção, amor,
carinho kkk somos carente e se não somos amados, adoramos qualquer amor, amor
por piedade, amor por ódio, amor por abuso etc.
Até em conferências científicas já escutei fofocas:
"sabe que o doutor fulano definiu Édipo sem ligar ao mito, mas à religião
evangélica? Sabia que o caso dela é um pastor daquela igreja?" e o
escutador escuta e destrói a vida o conferencista... Ainda bem que tudo se
grava e pode desmascarar os sujeitos desses imbróglios.
Há verdadeiras fofocas: ele é feio, é “gordo
nojento” (gordo é descrição do fato, é preciso ver o modo como se fala), é macaco,
é velho, é idiota, é Zé Ninguém... Pessoas que dizem “odiar fofocas”, podem de
fato odiar, mas estão sempre fazendo também, espalham as boas-novas do
nascimento de um boato (kkk) puro mau caráter, e escuda defensor da não fofoca,
e só a faz.
Por isso eu creio que uma das coisas positivas da “autopromoção”
é essa: fala, fala, mas fala de si, espalha boatos de si, bons e ou maus,
verdadeiros e ou mentirosos... Sim, na autopromoção funciona falar pessimamente
de si, objetivando comentários e famas. "Adoro espalhar boatos acerca de
mim mesmo" dizem que Oscar Wilde falou isso, juro! Você acredita, menina!
Oscar Wilde aquele “viadinho” arrogante... Bem-feito, por isso foi preso...
O melhor é ficar calado, e NUNCA mais conversar,
pois tudo pode virar fofocas, pois vivemos emitindo opiniões acerca de nós
mesmos, dos outro (pessoas comuns), de teóricos, artistas, ídolos,
desportistas, mulheres e homens famosos etc.
Melhor ainda é lutarmos para termos amigos, falar o
que sentimos para ele, e sermos protegidos, guardados com cuidado por esse
outro. Um amigo que entende o sofrimento do falador – o falador pode ter graves
problemas emocionais, bem como o falante, e cuidado, pois a doença mental pode
ter o objeto do rancor, o tema de sua perturbação. A psicopatologia não
pertencente a uma casta, contamina a todos e a todas.
Melhor ainda procurar um psicólogo que pode te
ajudar a descobrir os motivos de seu sofrimento (falador), do seu prazer
orgásmico em destruir o outro (o falante) e a “orgia da vítima” (objeto do
ódio, da fofoca, do rancor), sim, se ele sofre, pode (quem sabe) passar a
gostar desse lugar-tempo, pra dizer suas verdades, quem sabe nunca escutado. É
comum a vítima espalhar verdades de si, e depois sofrer com a boataria... sim,
uma fofoca pode ser verdadeira. Por ex: uma pessoa pode socializar que tem (de
fato) dois amantes, e no trabalho aparece com um e depois com o outro e mais
diz isso claramente e sua cultura/ sociedade condena isso, se não condenar não
há fofoca (kkk). Depois quando isso se espalha, ela pode se sentir magoada,
ferida.
Acho que é também recomendado que tenhamos cuidado
com quem falamos, onde falamos, quem pode escutar as coisas que dissemos... Uma
pessoa carente, sem vergonha disso, pode contar-me fofoca apenas para ter minha
atenção, meu amor e ao mesmo tempo meu sofrimento, minha dor e abandono. Sim,
uma boa fofoca desune.