"Quando era jovem, eu vivia muito
angustiado, era muito só, muito. Eu não estou fazendo melodrama, simplesmente
era uma angústia de desejar alguém que ficasse perto de mim, e me tocasse
corporalmente - era uma fome de amar. Não me importava: uma mulher, um homem,
um cão vadio, um pássaro daqui. Era só, e sem ninguém. Vivia com minha avó, e
também com minha tia que era uma histérica, que não permitia o toque. Essa
mania do não me toques tem sua etiologia advinda dos meus pais e irmãos,
do meu avô alcoólico que bebia porque faltava-lhe o toque. Na escola do segundo
grau, onde eu estudava na capital mineira, era algo tão pesado, tão, que aos
sábados e aos domingos eu tentava frequentar lugares públicos e ou cinemas com
o objetivo de fazer amizade - eu não pensava em sexo, juro, mesmo sendo tão
jovem e bonito! Mas não conhecia ninguém, nem mesmo um Seu Ninguém. Foi quando
li meu nome em primeiro lugar, aprovado no vestibular, então eu tive uma nítida
percepção de mim, percepção essa que nunca mais desgrudou da minha pele/ alma/
mente, sendo algo experiencial: 'minha área não é do amor-sexual, mas do
amor-ao-conhecimento'. Assim, ao longo do meu desenvolvimento e aprendizagem optei
por ficar só. Creio que nesse sentido da vida, quando estiver muito doente, à
beira da morte, eu sofrerei de forma absurda, pois acostumei-me a ficar só,
rodeado de livros, artigos científicos, revistas, internet, de técnicas, de
testes padronizados, de procedimentos, de filosofias, de etapas mornas, filmes,
séries, mangás, quadros, enfeites, panelas novas, fotos de atores que eu escolhi
como ídolos, bichos de pelúcia, além de muita comida podre - uma trôpega
respiração de merda. São coisas que dou vida, objetos e dispositivos que
humanizo e que substituem o outro-concreto-comigo. Disso tudo, nesse tempo e
espaço de cuidado, creio que morrerei mais rápido estando fisicamente perto do
outro, não suportando sua voz e um medo ferrenho desse mesmo outro que terá em
tocar um corpo decrépito, fedido. E nesse momento eu acho que pensarei: 'não
suporto o inferno desse meu amor fracassado' ".
[HPinel; ficção; vou corrigindo].