quinta-feira, 15 de outubro de 2015

O MESTRE QUE NÃO MISTURA ALHOS COM “BROLHOS” [1]: UM DOS MELHORES FILMES SOBRE PROFESSOR - Hiran Pinel

Vamos analisar o filme "Violência e Paixão" - de Luchino Visconti, de 1974. Vamos? Será uma análise, e não "a" análise - nada definitivo, tudo aberto a mais apreciações.

O título brasileiro desse filme é idiota, deveria ser "Peça de Conversação" (obras de arte que o professor tem interesse) ou "Adentrando por uma Família" ou "Pelo Interior de uma Família" (Gruppo di famiglia in un interno). Os títulos, esses dois, são do filme. Nada de violência e paixão kkk

O que esse filme pode ensinar aos professores e aos estudantes? Vamos à minha apreciação.

Um professor de artes, aposentado, mora em uma mansão decadente - tal qual ele, já fisicamente decaído. O professor gosta de quadros de pintura do tipo "peças de conversação" - de origem inglesa -, donde o ideal é desvelado (pintado), o romântico, o alienado. Quadros com famílias unidas, crianças, azulzinho, rosinha, cãozinhos ou seja, a (des)graça do real nos marca, mas fugimos dela pela obra de arte que representa o romantizado.

Então, uma família nobre e decadente, quer porque quer alugar a parte de cima da referida casa do professor, devido ao lugar que se localiza, numa área nobre e urbana - uma família urbana, decadente, imoral. A mãe dessa família, uma marquesa, tem um amante, um jovem pobre que participa ativamente da revolução de 1968 de Paris - rebelião dos estudantes na época (fato político real), era um líder. Assim, esse jovem é perseguido pelo Estado (França, Itália, Inglaterra etc.), ele é procurado tudo em um clima paranoico, persecutório. O professor, e esse jovem, começam a se aproximar, e ambos aprendem (e ensinam) um com o outro. O professor torna-se mais politizado (era demais subjetivo), e o aluno mais interiorizado, focando também a sua subjetividade.

A primeira vez que o assisti, não sabia, e por isso fiquei arrepiado demais com uma cena: o professor escuta uma música alta e confusa vindo da parte de cima. Ele levanta cuidadosamente e vai subindo, talvez para pedir "abaixem essa música" urbana, popular, vulgar - ele ama as clássicas. Quando sobe a escada a gente escuta a música de Roberto e Erasmo Carlos "quantas vezes eu pensei voltar, e dizer que o meu amor nada mudou...". O professor abre a porta e a música está mais alta, e então vê um grupo de jovens (talvez 6) desnudos e fazendo sexo grupal - homens e mulheres. Aí tem uma fala inesquecível da filha da nobre: "Venha professor, saia do seu mundo, entregue-se ao prazer". É um convite deveras provocativo, que todo professor gostaria de receber - ali, no meio da juventude, justo ela que ele perdeu. O jovem rebelde de 68, aproxima-se dele, e lhe faz um carinho de "tons sexuais", ampliando o convite - a amizade se transformou em paixão na relação professor-aluno. Eu amo a resposta do mestre: ele se afasta delicadamente, esteticamente, eticamente. É uma ética, uma bela ética - estética, pois.

O cineasta Visconti, que era de origem nobre, mas filiado ao partido comunista, pode estar a nos ensinar uma preciosidade pedagógica e psicológica: a de que o professor não deveria confundir "alhos com brolhos", e se confundir ótimo também kkk que assume as consequências das escolhas, Sartre. Escolhendo, o professor faz uma escolha, o de não se entregar ao seu orgasmo (sexual), mesmo porque depois só vem o real, e a educação se interessa por ela, ou que isso vem a significar. O seu prazer pode também ser uma bela aula, bem como o amor que os estudantes lhes dão, um amor pautado pelo respeito, ensino, aprendizagem, pesquisa objetivando não tomar o lugar do professor, mas ficar ao lado dele, pois ambos lutaram por esse ofício. Será que essa minha reflexão tem muito a ver com as peças de conversação? Idealistas, românticas, alienadas, afastadas do real...
Raríssima essa película, raríssima - uma pena que poucos a assistem no Brasil, pois não é um filme de ação, não é - ainda bem kkk


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[1]. Brolho: Formação protuberante que nos troncos dos vegetais, dá origem a uma brotação de ramos, folhas e flores. Pode também relacionar-se (brolho) com sexo: pau, falus. Deveria ter escrito “bugalhos”, mas eu sempre disse brolhos, que no caso do texto, vale a pena manter, por relacionar-se a um tema sexual.