terça-feira, 18 de dezembro de 2018

COR VINHO DO SER NO MUNDO
ANALISANDO, DE MODO FENOMENOLÓGICO, PARTE DO EPISÓDIO 13 DE "SOTUS THE SERIES".

Hiran Pinel

O episódio 13 de "Sotus The Series" (1a temporada), corresponde ao final da "novel" que deu origem ao roteiro da série. Trata-se da "cena do casamento do ex-hazer P'Tum com a enfermeira". Os convidados têm que usar alguma peça da roupa que contenha a cor vinho - que em determinadas culturas, pode simbolizar algo como o amor, a paixão, o inebriamento, a (com)paixão, desejo e coragem de mudar o que está estagnado. O "couple" vai comer em um boteco de rua, e depois, se dirige à ponte Rama VIII - aí temos certeza de que estamos em Bangkok, na Tailândia. No meio da ponte, com música romântica ao fundo, com doces flash back, o espaço parca e estrategicamente bem iluminado,  o casal ("couple") transforma aquilo ali em "lugar vivido" (algo como seu lar), e o fazem pelos corpos, roupas, penteados e pelos diálogos inesquecíveis pautado por um ser e outro ser, "um que manda e outro que obedece" e que ali isso se diluiria, e então - se beijam... O ator Singto, na pele de Kongpob, ao final do beijo, sim, ele sorri, isso pela experiência inusitada. Por que inusitada? Ora, conta-se no meios dos fãs, que a cena indicava que eles dariam "apenas um selinho", um leve encostar dos lábios - nada mais do que isso, mas Krist, na pele de Arthit, sem avisar ao colega ator, beijou-o de fato - com a boca suavemente aberta, dando entender algum contato de língua, carícias etc. Singto se sentiu incomodado por desrespeitar a ordem do diretor e do roteiro, mas ele não quis interromper a cena, seja por respeito à Krist, afinal seu colega estava dando o melhor e de si e de como "entendeu a cena", bem como pelo gasto de tempo na repetição (da cena), o que, de certo modo, prejudicaria toda a equipe de filmagem. Singto prosseguiu, mas no processo do beijo, como estou a contar-lhes, ele começou a sorrir levemente, indo, mesmo sem querer, construir psicossocialmente um outro sentido para a cena e série: os dois personagens masculinos se entregaram à ingenuidade da primeira vez, o da vivência "disso-daí-mesmo", uma das características que mais gosto em série yaoí, talvez a mais vital, na minha opinião, a mais comovedora, a mais arrebatadora. O leve riso do prazer e da timidez de Singto corresponde ao olhar de descoberta de Krist - assim as pessoas dos atores e dos personagens parecem ter se misturado, imbricado, tornando a cena complexificada. Foi isso que deu à cena seu ar Cult, algo inesquecível e passível de cosplays por fãs como eu sou. Por isso, eu fã de obras de arte, uma boa série me faz esquecer da desgraceira do cotidiano real. Sem a ilusão e o sonho, que uma obra de arte nos evoca, não há o real, pois a realidade demanda "projeto de ser", e sem o real, a fantasia não se torna concreta e nem presente, uma presença no sentido de provocar a si mesmo (e ao outro) algumas possibilidades de "ser no mundo". Em síntese, a realidade e a fantasia compõem o mesmo polo que pode dar sentido de viver do ser humano, um "ser no mundo". Nesse processo vivido, então somos frágeis/ fortes, finitos, fluidos, sonhadores, sólidos efêmeros - sim, isso é o que somos, sendo com o outro, no mundo.