segunda-feira, 7 de março de 2016

UMA MULHER SILENCIADA...

Acabei de assistir "Philomena" (2013; direção de Stephen Frears). Eis minha sinpse apreciativa: Tudo começa antes do filme. Um jornalista chamado Martin Sixsmith, eescrevu um livro com 448 páginas sobre uma mulher chamada Philomena. O filme narra essa história, do jornalista e essa mulher, naquele contexto social e histórico, de próximo a 1952 até 50 anos depois. Trata-se de um segredo, de uma mulher que se sente culpada, apegada a esse valor religioso.
Retrocedendo em um filme feito de "flasback", retorno memoriais de Philomena, magistralmente interpretada pela diosa Judi Dench.
Em 1952, jovem de 14 anos, Philomena Lee engravidou descuidadoramente de uma relação aventureira - algo tão comum hoje em dia, humano. Ela passou a ser descrita como "mulher indigna" por seu entorno - família, igreja, cultura da época, arrogância inglesa... Era uma família católica da Irlanda, que vivia em conflitos católicos e protestantes (ainda há isso). A jovem é enviada para uma organização cristã chamada Convento de Roscrea, lugar (tempo) que nasceu Anthony, que aos quatro anos de idade, foi tirado da moça Philomena e entregue a um casal norte-americano. Isso, faziam isso: tiravam.... Por achar-se culpada e pecadora, Philomena foi silenciada por 50 anos. Refletindo sobre a ética (e estética) de calar-se ou não, ela tomou a decisão (psicológica e clinicamente acertada) de sair a (pró)curar procurar seu filho, e buscou ajuda do jornalista já descrito o nome - dignamente interpretado por Steve Coogan. Ele era um jornalista que trabalhava na BBC, que a acompanhou até os Estados Unidos.
Ela a procura e passamos a conhecê-la (cristã até o fim, como tendo capacidade de perdoar as freiras que faziam isso, tirar, mentir etc.), ao jornalista (ateu convicto e com as mesma justificativas - adorei o personagem), o filho (gay, tocava piano, foi assessor íntimo político de Ronald Regan, escondia que era gay, tinha uma amiga que fingia ser sua namorada, começou a protestar quando o partido político no qual trabalhava negou dinheiro pras pesquisas na área biomédica do Vírus HIV/Aids, tinha companheiro, sensível, a família americana era uma boa mãe, mas um pai perverso e violento etc.), conhecemos o companheiro, que calejado finalmente se mostra acessível a Philomena etc.
A idosa Philomena fica com raiva pois nada indica que Anthony desejava lembrar-se de sua origem irlandesa. O jornalista funciona como um detetive no sentido de Ginzburg: captura pistas. E quando ela desiste do empreendimento emocional, ele lhe mostra um broche que sempre seu filho usava, um símbolo da Irlanda.
O companheiro do filho lhe diz que ele a procurava, e mostra filmes que eles faziam dele na Irlanda, já com sintomas da Aids. E que as freiras, a mesmas do tempo de juventude de Philomena, diziam desconhecer Philomena, as mesmas que disseram hoje a ela, que o filho está desaparecido.
Anthony, o tempo todo, estava ao seu desejo, enterrado no cemitério desse convento.
O filme inteiro encontramos uma Philomena dividida em contar a história (via jornalista) ou não contar. E ao final, o periodista lhe diz que não irá contar a história, e finalmente ela autoriza que se conte. É um dado histórico da Irlanda, um país católico ao extremo, e as ações moralistas dessas freiras, que existiam para legitimar a moralidade da Igreja, que existia para legitimar a moralidade do Estado.
Música instrumental linda, interpretações bacanas e equilibradas... Dench é uma diva, e dá uma dignidade ao personagem rara. Não é lacrimogênea, não é melodramática como encontramos em telenovelas mexicanas. O tema é tratado com delicadeza, e no ponto certo. Como uma mãe e o filho se amararem se não sabiam um de si?
Agora, há várias perguntas que não querem se calar, mas destaco uma: Como uma pessoa pode se calar por 50 anos sobre um segredo que a atormenta de modo profundo? E mais: Philomena era sabedora de que se a experiência era algo dela, por outro lado envolvia o outro (namorado, sua família, a igreja, o Estado, a monarquia, as religiões etc.) e o mundo. Como? ... Gente, falar, isso sim é a salvação psíquica... Falar, gritar, espernear, gemer, contorcer-se.... A linguagem oral e gestual é para isso: para produzir um afastamento das coisas maléficas advindas do social, e que fizeram conosco, nos fizeram engolir nesse contexto. Falar, por outro lado, é denunciar fatos sociais, históricos e cultura - e isso é ótimo para uma sociedade -, e é claro, um refinado cuidado de si.
A pergunta é mais simbólica, pois posso imaginar a psicodinâmica social de Philomena.... Uma sociedade, e história (na cultura) é capaz de nos calar, mesmo estando corretos e dignos... O tempo sempre apura, mas esse mesmo tempo, no tempo do preconceito, nos mata, nos sufoca.... Quando nos liberta já não temos mais a juventude.... Estamos com os pés à beira da catacumba kkk

[HPinel]